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Miguel Bombarda e Manuel Fernandes Santana um confronto de ideias

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Vítor Neto

No quadro da divulgação da ideologia cientista, Miguel Bombarda assumiu-se como um dos intelectuais mais esclarecidos. Ao assumir uma concepção monista do universo contrariava o conservadorismo ideológico sustentado pelos pensadores católicos. Por isso, a Igreja recorreu ao desafio lançado pelo materialismo de Bombarda através de um dos seus membros mais esclarecidos, o jesuíta Manuel Fernandes Santana. Influenciado pelos pensadores materialistas – Haeckel, Molescholt, Verworn, Vogt, Buchner e Darwin –, o professor da Escola Médico-Cirúrgica utilizava os seus conhecimentos nos domínios da biologia, da sociologia, da psicologia experimental e de outras ciências para fundamentar a sua teorização sobre as origens da vida, a auto-suficiência da matéria, a consciência do homem e a moral. Ao assumir a ideia de ciência e ao acreditar na obtenção da verdade científica por via racional, contestava as visões ideológicas do universo. Contudo, o determinismo cósmico anulava - a nosso ver - a ideia de liberdade já que o ser humano ficava desprovido da capacidade de orientação da sua actividade. Por isso, a submissão do homem a um causalismo cego e a rejeição do livre-arbítrio levavam Bombarda a eliminar, em certa medida, o valor do homem e da liberdade. Desconhecendo o materialismo dialéctico aprisionava o indivíduo nas malhas de um universo fechado, subordinado à fatalidade de um movimento fenoménico predeterminado por um causalismo imanentista. Ao monismo de Miguel Bombarda, opôs o padre Manuel Fernandes Santana uma concepção dualista do cosmos. Para ele, a ordem do fora preestabelecida por Deus e a matéria, o movimento, as energias cósmicas e a sua orientação inicial encontravam a sua explicação última no supremo arquitecto que o concebera. Nesta perspectiva, o sacerdote recusava o materialismo mecanicista e reafirmava a doutrina católica consubstanciada numa visão que radicava numa ligação entre o corpo e a alma. Criado à imagem e semelhança de Deus, o homem tinha capacidade para agir sobre o mundo que o rodeava. Desta forma, Fernandes Santana refutava o determinismo sustentado por Miguel Bombarda, mas caía numa concepção dualista sem qualquer base científica. A polémica entre os dois intelectuais exprimia o radicalismo de discursos opostos que emergiam de duas visões do mundo antagónicas.


ISBN:

eISBN: 978-989-26-0362-9
DOI: 10.14195/978-989-26-0362-9_12
Área: Artes e Humanidades
Páginas: 117-124
Data: 2006

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